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Segurança Alimentar : A Importância da Atuação do Nutricionista

1 - Quais são as recomendações legais a serem seguidas pelo nutricionista no controle higiênico-sanitário?

Contamos no momento, para empresas e instituições que manipulam alimentos, com alguns documentos de normatização federal referentes ao controle higiênico-sanitário, a saber: Portaria nº 1.428/93 e Portaria nº 326/97 do Ministério da Saúde, Resolução RDC
nº 12/01 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e Portaria nº 328/97 do Ministério da Agricultura e do Abastecimento. Nas esferas estaduais e municipais de cada localidade pode também existir alguma determinação oficial específica para o uso dos seus profissionais.

Considero bastante interessante conhecer estes documentos regionais, pois geralmente são mais detalhados do que a regulamentação federal e servem, por isso, para enriquecer o
conhecimento na área. Podem servir também como referência técnica para fundamentar as ações ou decisões que venhamos a ter.
Sobre os que foram citados, vale destacar a importância e o conteúdo da Portaria nº 1428 de 26/11/93 - introduziu os conceitos e a determinação de aplicação, na prática e por todos, das Boas Práticas e do APPCC como sistemas de controle efetivo dos processos de trabalho com alimentos.

Norteia a ação fiscal da vigilância sanitária, define o perfil daquele que vai desempenhar a responsabilidade técnica pela produção e ainda apresenta o conteúdo que deve-se abordar nas Boas Práticas e na determinação do Padrão de Identidade e Qualidade dos produtos e dos serviços.
Já a Portaria nº 326 publicada em 30 de julho de 1997, traz o detalhamento ponto a ponto referente ao processo de manipulação de alimentos na cadeia alimentar.

Aborda os critérios de segurança esperados para cada etapa ou agente de influência na qualidade higiênico-sanitária do produto. Entretanto, já existem documentos que apresentam detalhamento maior do que esta, sobre as práticas que devem ser adotadas em um programa real de controle de qualidade para alimentos.
Em substituição à Portaria nº 451/97 do Ministério da Saúde que regulamentava os padrões microbiológicos para alimentos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária publicou recentemente a Resolução RDC nº 12 em 2/01/2001, sobre o mesmo tema, mas com maior abrangência do que a anterior no que se refere às definições, aos tipos de alimentos e até quanto a quantidade mínima de amostra a ser coletada para proceder a análise laboratorial.

O Ministério da Agricultura e do Abastecimento, para normatizar as práticas dos estabelecimentos que estão sobre sua competência, definiu, na Portaria nº 328 de 4/09/2001 também um regulamento técnico sobre as condições higiênico-sanitárias. O conteúdo se aproxima muito da Portaria MS nº 326/97, mas tem suas peculiaridades.
Cabe dizer nesta oportunidade que existem outros documentos afins que somam conhecimentos importantes para se obter a tão propagada “qualidade inócua do alimento”.

Não devem ser esquecidos, a exemplo, as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho, a Resolução de Descarte de Resíduos de Saúde, além das Instruções de Biossegurança e de Processamento de Artigos e Superfícies através de métodos de limpeza, desinfeção e esterilização.

2 - Como podemos garantir boas práticas de manipulação em nossa área de trabalho?

Reconheço, e tenho tido provas, que o melhor caminho para se conseguir fazer funcionar as boas práticas em serviços com alimentos, é adotar um trabalho permanentemente com pessoal treinado e processos monitorados e registrados. É um pouco da orientação do método APPCC, que aponta para a prática preventiva passo a passo, só que em outro nível de aprofundamento técnico-científico.

O treinamento, nas suas diversas formas de aplicação, é o momento célebre de esclarecer, à aquele que opera, principalmente os motivos das ações e que há importância, nas práticas preconizadas, para todos os envolvidos no processo. É mister desmistificar o pensamento, muito comum de ocorrer, de que o benefício é unilateral e nunca voltado para o quem faz acontecer.

A atitude de monitorar e registrar, definem um permanente acompanhamento e avaliação da eficiência e eficácia dos recursos e técnicas aplicados às etapas que cercam o alimento ou produto, dentro ou fora da empresa e em tempo de decidir as correções necessárias. A determinação prévia do padrão de qualidade dos insumos e do padrão de identidade e qualidade do produto final porém é imprescindível na adoção deste caminho.
Conseguimos, assim, a estrutura - recursos humanos e insumos e processos ajustados em prol de resultados previstos, literalmente e subjulgados aos parâmetros da saúde púbica.

3- Existe um roteiro já definido para elaboração do manual de boas práticas?

Elaborei, há algum tempo atrás, um roteiro que seria usado no meu particular inicialmente, mas que depois, foi reconhecido pelos conselheiros do CRN-4ª Região gestores da época, como instrumento de referência para os outros nutricionistas. Assim, montamos um programa de divulgação e disponibilização do material, junto com a legislação de referência, com o mínimo de custo possível.
Para criar o roteiro, utilizei como ponto de partida os itens do conteúdo de trabalho com boas práticas da Portaria MS nº 1428/93. Sobre eles, discorri detalhadamente e acoplei outros regulamentos, a exemplo das Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho.

O resultado é um documento amplo, que pode auxiliar tanto pequenos como grandes estabelecimentos que manipulam alimentos, como indústrias ou produtores de refeições de pronto consumo, na elaboração do seu Manual de Boas Práticas. Por ser um
material sugestivo, permite a incorporação de e/ou exclusão de alguns aspectos de acordo com a realidade, o interesse e necessidades do local, desde que se mantenha atendendo às determinações da Portaria referida.

Já obtive retorno de alguns nutricionistas, que partiram deste roteiro apresentado na home page do CRN-4 e que conseguiram realizar um manual extremamente consistente e personalizado.
Algumas Vigilâncias Sanitárias possuem roteiro para o mesmo fim, porém, eram divulgados entre o público específico que buscava informação para providenciar o registro de seus produtos, o que não atingia os responsáveis por restaurantes comerciais e institucionais.

4 - Quais são os benefícios da implantação de um Manual de Boas Práticas?

Diversos são os benefícios. Para começar, obtém-se com essa redação, o registro dos protocolos adotados na empresa de forma que a troca de pessoal não implicará na alteração das práticas. Neste contexto refere-se a funcionários de vários setores - da manutenção, do transporte, de fornecimento de produtos, além dos da própria manipulação de alimentos.

Outra consideração se faz sobre a participação obrigatória de componentes de diferentes instâncias dentro da estrutura organizacional, principalmente entre contratantes (empresa pública ou privada) e contratados (empresa privada de limpeza, de produção de alimentos ou de outra prestação de serviços) gerando uma troca de informações importantes para os ajustes no processo.

O ato de registrar desperta a maior intensidade do desejo de buscar o perfeito ou o “mais adequado possível”. Remete o profissional à técnica e à ciência sobre os conhecimentos relacionados à sua prática, de modo que ele possa confirmar os acertos daquelas compatíveis com as referências e ajustar as que ainda não se aproximaram do ideal. Por esse caminho, confio que o nutricionista irá, naturalmente, se voltar mais para o estudo metodológico dentro do ambiente de produção de alimentos, ampliando o volume de trabalhos científicos nesta área, o que refletirá em benefício para muitos profissionais e usuários.

Por ser um documento, indiscutível é a permissibilidade que produz de recuperar informações com facilidade nos momentos cruciais que as dúvidas surgem, mas, sem sombra de dúvida, é na função de instrumento diário como fio condutor das tarefas, em prol da inocuidade dos produtos que se estabelece o maior benefício do Manual de Boas Práticas.

5 -Qual é a importância da participação do nutricionista na elaboração do Manual de boas Práticas?

Fica difícil conceber a elaboração do Manual de Boas Práticas em empresas de produção de alimentos sem, pelo menos, a participação do nutricionista. Esse estreito elo justifica-se uma vez que é o profissional que detém conhecimentos da área e os pré-requisitos para a compreensão dos demais afins, necessários para compor o conjunto de informações sobre questões de qualidade, avaliação, controles, saúde e doença humana veiculada por alimentos, gerenciamento, higiene, só para citar algumas.

Na minha visão, porém, no nutricionista deste início de século é tímida a certeza nos avanços que podemos incorporar na saúde pública e pouco conhecidos são os atalhos que podem nos levar a eles. De sorte, há muitos de nós empenhados nesta busca alimentados pelo reconhecimento de fazer e bem.

6- Quais são as barreiras que o nutricionista encontra na implantação do Manual de Boas Práticas?

A maior barreira é achar que a implantação das Boas Práticas é um trabalho isolado, individual. Isso remete a uma tarefa árdua, cansativa, e com possibilidade de reconhecimento parcial do esforço, o que é desestimulante! Na verdade o trabalho de equipe permanente, envolvendo todos os funcionários, inclusive de outros setores, os fornecedores, os prestadores de serviço e os gestores da empresa, é o necessário. Tanto no momento da determinação dos conceitos e dos métodos de alcance como no desenvolvimento das práticas diárias, considera-se que de forma direta ou indireta todos estão envolvidos com uma ou outra etapa do processo e, por isso, precisam conhecer bem os papéis próprios e alheios para o caminhar em única direção sem atropelos. As Boas Práticas são atos humanos!

Outra barreira é superestimar a influência da estrutura física, principalmente a predial, na qualidade dos produtos tendo a aparência de alto custo como referencial. É o tipo de agente que, na verdade, a avaliação sanitária espera uma apresentação com as características que conferem ao ambiente a segurança contra a proliferação de outros diretamente contaminantes dos alimentos. O lema deve ser da simplicidade com transparência de limpeza.
Quanto aos processos e seus controles, muito já vem sendo feito, mas pouco vem sendo reconhecido por várias razões.

Uma delas é a ausência de registros das práticas. Um histórico do controle da temperatura dos equipamentos de conservação de alimentos a frio, prova a atenção à conservação adequada dos gêneros na preservação da deterioração natural ou pôr agentes indesejáveis; prova o uso otimizado do produto, com menos desperdício e indica que ocorrerá, antes da perda total, a transferência dos perecíveis quando o equipamento sinalizar uma parada.
Problemas para obtenção de recursos financeiros ou materiais podem ser amenizados, quando não resolvidos, com a fundamentação dos propósitos da requisição. Neste capítulo, vale também o registro e arquivo seguro deste discurso carimbado com o “recebido” pelo gestor para servir de, pelo menos prova de cumprimento do dever de informação justificada no caso de não ser atendido.

Diversas outras barreiras podem ser vislumbradas na implantação das Boas Práticas devido às características dos serviços, das pessoas, das necessidades, dos desejos. Creio ser importante a identificação dessas barreiras e a consideração delas como pontos que necessitam de maior atenção e empenho para serem vencidos e que o resultado embasará a prática para amenizar o embate com as próximas, que com certeza virão.

7 - Em sua opinião qual é o maior desafio que o nutricionista encontra para garantir o controle higiênico - sanitário?

O desafio é tornar-se um permanente inconformado com as condições higiênico-sanitárias insatisfatórias. Por este comportamento o profissional encontrará sempre esforços e fôlego para buscar soluções científicas, criar, adaptar, conhecer novas opções, novos paradigmas. E daí exercer verdadeiramente a atividade profissional que o diferencia dos funcionários dos níveis inferiores de formação acadêmica. Ser capaz de identificar falhas e/ou perigos e definir procedimentos corretivos eficientes e eficazes. Também reconhecer-se como prestador de serviço e fornecedor de produtos ao usuário perante uma lei que define direitos e deveres para ambos nesta relação. E que acima de tudo a atividade de “fazer alimento” volte-se para um ser humano para o qual juramos uma dia proteger a saúde.

Autor

Dra. Arlete dos Santos Moreira Nutricionista da Vigilância Sanitária Estadual, Especialista em Ciências dos Alimentos pela UNIRIO.

Os autores estão em ordem alfabética

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